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21 | Jul

A MP 927, editada pelo Governo Federal, perdeu a sua validade

A medida provisória que flexibilizava importantes regras da legislação trabalhista caducou dia 19/07/2020

A MP 927, editada pelo Governo Federal, perdeu a sua validade

Em razão da pandemia do novo coronavírus o Governo Federal editou medidas provisórias com o afã de regular, de acordo com o contexto emergencial, as relações de trabalho. Cite-se que, a despeito de algumas das medidas editadas serem convertidas em lei, tendo suas disposições efeitos permanentes ou com termos fixados, outras não passaram pelo crivo legislativo do Congresso Nacional.

É o caso da MP 927, publicada em 22/03/2020, que não foi convertida em lei pelo Poder Legislativo em razão da falta de consenso dos parlamentares, perdendo sua validade, portanto, no dia 19/07/2020.

Conforme informativo já publicado em nosso site sobre a medida provisória 927 (http://www.mellopimentel.com.br/acontece/23/03/2020/mp-9272020), em seu texto eram flexibilizados diversos requisitos dos mais variados institutos jurídicos, objetivando a manutenção dos postos de trabalho. Com a perda da sua validade, as normas anteriores à edição da MP voltam a ser observadas.

Confira as principais consequências da caducidade da MP 927/2020:

(a) Teletrabalho

- O empregador não pode mais determinar unilateralmente a alteração do trabalho presencial para o remoto. O retorno ao trabalho presencial, ademais, não mais demandará apenas aviso unilateral com antecedência de 48 horas, sendo necessário em tal caso observar o prazo mínimo de 15 dias.

- Na eventual necessidade de transição em períodos menores, é obrigatório o mútuo consentimento registrado em aditivo contratual, conforme previsto no artigo 75-C, §1º, da Consolidação das Leis do Trabalho.

- Não pode mais ser aplicado o teletrabalho para os aprendizes e estagiários.

- O tempo de uso de aplicativos e programas de comunicação fora da jornada do empregado pode constituir tempo à disposição, regime de prontidão ou sobreaviso, conforme o caso, salvo se houver ajuste individual escrito em sentido diverso.

(b)  Férias individuais

- O empregador não pode avisar a concessão de férias com apenas 48 horas de antecedência, voltando a ser observado o prazo de, no mínimo, 30 dias (CLT, art. 135).

- Não há mais autorização legal expressa para a concessão de férias para os empregados que já não tiverem cumprido o respectivo período aquisitivo. Ainda que haja algumas decisões que, antes da MP 927/2020, tenham admitido a antecipação de concessão de férias relativamente ao respectivo período aquisitivo, tem-se que essas manifestações judiciais eram excepcionais e vinculadas a circunstâncias particulares muito específicas.

- O fracionamento das férias deve observar as regras específicas do artigo 134, §1º, da Consolidação das Leis do Trabalho.

- O pagamento da remuneração juntamente com adicional de 1/3 de férias volta a ser devido até 2 dias antes do início do seu gozo.

(c)  Férias coletivas

- A comunicação do início das férias não pode mais ser feita com, no mínimo, 48 horas de antecedência, voltando a valer o período quinzenal previsto na Consolidação das Leis do Trabalho.

- Deve voltar a ser respeitado o máximo de 2 períodos anuais de férias coletivas.

- Cada período de férias coletivas deve observar o tempo mínimo de 10 dias.

- Volta a ser obrigatória a comunicação prévia ao órgão local do Ministério da Economia e ao sindicato representativo da categoria profissional.

(d)  Antecipação de feriados

- Não é mais possível antecipar o gozo de feriados não religiosos.

(e)  Banco de horas

- Não é mais possível pactuar banco de horas específico, por acordo individual, para compensação em até 18 meses. Volta a ser observado o disposto no artigo 59, §5º, da Consolidação das Leis do Trabalho, que anota o prazo máximo de 6 meses para as hipóteses de instituição de banco de horas por meio de acordo individual.

(f)   Exigências administrativas em saúde e segurança do trabalho

- Não está mais suspensa a obrigatoriedade da realização dos exames médicos ocupacionais.

- Volta a ser obrigatória a realização de treinamentos periódicos relacionados à saúde e segurança do trabalho, inclusive de forma presencial.

INCERTEZAS QUANTO A CONSEQUÊNCIAS

A rigor, as consequências jurídicas concretas da ausência de conversão em lei podem ser objeto de tratamento por meio de decreto legislativo, para o que está previsto um prazo de sessenta dias.

Acontece que  o Congresso Nacional não tem editado dispositivos da espécie, o que atrai a incidência da regra do artigo 62, §§ 3º e 11, da Constituição Federal. Caso essa prática se confirme, então, as regras da MP 927/2020 serão tidas como vigentes no período entre sua edição e sua caducidade, preservando-se a validade dos atos praticados com base em seus dispositivos.

Os eventos editados no período e que tenham tido seus efeitos consumados não deverão, portanto, ter sua validade questionada em razão especificamente da caducidade da medida provisória.

Situação especialmente complexa são os acordos pactuados durante a vigência da MP 927/2020, mas que possuam efeitos futuros. Exemplo é o diferimento do adicional de 1/3 de férias para pagamento até 20 de dezembro. Nesse caso, se não houver disposição em sentido contrário em decreto legislativo, em que pese a possibilidade de existência de entendimento em sentido diverso, temos a opinião de que os efeitos pósteros pactuados com base na medida provisória deverão ser mantidos (mesmo com a perda da eficácia da MP), de modo que, no caso específico das férias, deve ser respeitada a possibilidade de pagamento do adicional até 20 de dezembro.
Efetivamente, as férias deverão ser reguladas pelo direito vigente no momento em que concedidas, ocasião em que se estabeleceu a regra própria de pagamento do adicional respectiva.

A perda da validade da norma provisória impacta negativamente nas relações de trabalho, adicionando insegurança a um ambiente já complexo. As disposições contidas na Consolidação das Leis do Trabalho, notadamente algumas relacionadas a prazos e formas para algumas alternativas de comportamento das empresas, não estão em consonância com o inesperado cenário pandêmico que a sociedade atravessa.

Um grande número de situações concretas sofrerá os efeitos da caducidade da MP 927/2020, podendo haver necessidade de ajustes individuais ou coletivos específicos para o afastamento de riscos, conforme o caso.

 

Por Benick Santana e César Caúla. E-mail: trabalhista@mellopimentel.com.br